União do Parque Acari
“Ilê Aiyê – 50 anos de luta e resistência!”
Carnaval 2024

S I N O P S E

“Que bloco é esse?”

É o Ilê Aiyê da liberdade, subindo a ladeira do Curuzú, em ascensão de um “canto sideral”.

É o reconhecimento daquele que ao longo do tempo se tornou uma entidade viva e percursora, regida sob o compasso firme e em prol da valorização do povo negro brasileiro.

O Ilê tem a força ancestralizada e a nobreza que cabe no compasso e na cadência do Ijexá.

É o “Ilê de luz”, é coragem da providência “entre laços de vida”, marcado na história de luta.

É uma “negra sinfonia”, à sabedoria e à imposição solidária à inversão da ordem.

Um pantheon de riqueza, que esmaga a tristeza na reconstrução do “charme da liberdade” de uma grande nação.

O Ilê Aiyê é projeto de valorização de uma “sociedade”, é o sincretismo distinto de uma doutrina ancestral.

O Ilê é o grito forte que ecoa no universo, é uma herança de vida na filosofia do nosso carnaval.

O primeiro bloco afro do Brasil se faz referência como um ciclo existêncial e da humanização de uma raça, referência em favor do povo negro.

Nasceu em Salvador, na Bahia em 1º de novembro de 1974, o firmamento de protesto contra o racismo, difundindo um sistema operante e positivo de representatividade negra, com ênfase nas raizes africanas da cultura brasileira, divulgando a arte, a música e a dança.

Caracterizado com vestimentas e desenvolvendo projetos de intensidades pedagógicas, fruto da ação da mãe de santo “Hilda dos Santos” (Mãe Hilda Jitolú) e do seu filho Antônio Carlos (vovô), o bloco é resistência. Tem em sua essência um sentimento constante, onde o seu coração é um abrigo de portas abertas, tornando se a casa de tanta gente, e os seus pés enraizados no chão, são como um elo de conexão do povo com a terra. O Ilê é o exemplo de uma nação africana chamada Bahia.

Inspirados pelas lutas de direitos civís nos Estados Unidos, pelas guerras de libertação contra o colonianismo e pelos movimentos norte-americanos do black power e dos panteras-negras.

Nos inícios dos anos 70, Apolônio (popô) e outros moradores do entorno da Ladeira do Curuzú, na Liberdade, planejam montar um bloco de carnaval formado só por negros.

É uma resposta ao racismo, que mesmo não explícito, inibe a participação de afro-descendentes no circuito oficial da cidade.

Com insígnias do Candomblé, Opaxorô de Oxalá e os tridentes de Exú são os elementos de expressões gráficos que representam o grupo.

A sacerdotisa Mãe Hilda Jitolú, do terreiro Ilê Ijexá, aprova então a iniciativa do Ilê e impõe a condição de participar do cortejo com a finalidade de desestimular a repressão aos foliões (negros).

Atribui se então a ela o nome do bloco (Ilê Aiyê), que na língua Iorubá significa “casa” (Ilê) e “terra” (Aiyê).

Características de proximidade do grupo com o Candomblé, o Ijexá é o ritmo predominante, derivado da religião dos orixás.

Desde o primeiro desfile o Ilê Aiyê promove a valorização da população negra da África e da diáspora africana nas Américas. Destacando se assim, na celebração de personalidades afro-descendentes da história brasileira. Entre os artistas influenciados pelo bloco estão, Gilberto Gil, Margareth Menezes e Carlinhos Brown.

O “Ilê é ímpar” e com tamanha representatividade, o bloco sai as ruas com cartazes, adereços e cabelos alusivos à negritude, o grupo segue sob os olhares vigilantes da Polícia Federal, sendo vaiado e recebendo críticas da imprensa, com a alegação de contrariar a suposta “democracia racial brasileira”.

Com o objetivo de africanizar o Carnaval soteropolitano, o Ilê Aiyê trancende a sua trajetória existencial, e este evento, (o carnaval), contribui para moldar a imagem e o cotidiano da população negra da metrópole.

Começam então a exibir tranças, cabelos black power e rastafari, batas africanas e búzios, esses mesmos búzios representam o logotipo do bloco.

Vestidos nas cores preto, amarelo, vermelho e branco, e sobre a divisa – “perfil azeviche” em referência ao mineral que simboliza a pele negra.

Sob a influência deste grupo, posteriormente surgem outros blocos com inspiração africana em Salvador, como o Malê Debalê e Olodum.

O Ilê tem o seu reconhecimento e seu maior significado através da luta pela igualdade de uma “negra tentação”, onde em seu cortejo desfila a sensibilidade de seus valores questionados.

Em uma festa idealizada como “A noite da beleza negra”, é escolhida a Deusa do Ébano, a “negona mal-assombrada”. A mais bela da noite segue à frente como uma rainha de referência e de representatividade do axé do bloco em suas apresentações.

O Ilê Aiyê dedica seus temas aos povos africanos nunca exaltados, entre eles os de Ruanda, Angola e Nigéria, mas no ano de 1989 o tema volta se para a história brasileira em homenagem a Zumbi dos Palmares.

Mas não é só ao Carnaval que o Ilê Aiyê se dedica.

Uma escola comunitária é fundada em 1988. A instituição oferece os primeiros anos de ensino fundamental e tem por eixo temático a equidade racial de gênero.

Uma escola de percussão abre as portas em 1992 para formar jovens instrumentistas para a Banda Band’aiê.

Três anos depois inicia se a edição anual dos cadernos de educação, com textos sobre a história negra.

Em 2003 inaugura a sua sede.

Em 2010 é considerado Patrimônio Cultural da Bahia.

O Ilê toma o espaço de contestação e situa o negro como sujeito, e não como objeto marginalizado nas representações histórica, social e cultural do Brasil.

Junto aos seus propósitos, o Ilê Aiyê se torna um produto legítimo de uma consciência guiada e com posicionamentos de liberdade. Desfila então as suas conquistas direcionadas à uma cultura carnavalizada e expande seus objetivos, transformando o que antes era supérfulo em dignidade essencial, pessoal e social.

E nesse Carnaval, o som de atabaques e tambores, e os batuques ritmados do Ijexá se misturam na cadência da bateria União de Ritmos, fazendo se também presente neste culto de celebração de beleza à negritude.

Esta Avenida é um templo sagrado, e nessa ladeira fantasiada, os acontecimentos são privilégios, onde a aspereza da realidade sai de cena.

Nesse percurso, numa espécie de “desorientação premeditada”, “o ridículo” se transforma no “mais belo dos belos”, uma legítima sensação de liberdade no pleno exercício de fazer valer os seus direitos.

Esta estrutura se reorganiza anos após anos, com valores de crença, de obediência e religiosidade.

Cada desfile do Ilê Aiyê é um banquete de excesso, de busca pela igualdade que navega o consciente absoluto, deixando marcas do conceito de viver digno e plenamente o seu livre arbítrio.

O Ilê tem o brilho do ofício de viver o Carnaval de um movimento de beleza negra, com olhar diferenciado e de vocação pelo princípio, podendo então ser chamado de uma “reconfiguração no reinado de Momo”, uma verdadeira metamorfose na evolução do reconhecimento do Carnaval no Brasil.

Emoldurado pelo cinquentenário deste gigante e regido pelo batuque da alma do samba carioca, a União do Parque Acari abraça o Ilê Aiyê, festeja seus cinquenta anos e a glória dos seus manifestos, que são as características primárias da sua longevidade, da sua dignidade e da sua origem, e mantém acesa a chama da sua ideologia significativa e estrutural.

O Ilê Aiyê é o grito forte que ecoa no universo, na contramão e no avesso de uma conquista plural, é a esperança na vida da gente, é o reinado negro na filosofia do nosso Carnaval.

Hoje a Sapucaí se transforma na “senzala de barro preto”, sem troncos, mordaças ou chicotes. A “passagem do Ilê Aiyê” é um tributo à liberdade, que sobe a Ladeira do Curuzú, sob os olofotes dos “negros de luz”, que refletem a magnitude do firmamento de fé, onde a fonte dessa energia é a claridade do brilho que emana do seu axé.

Nota:

As palavras grifadas contidas na elaboração / construção desta sinopse, são referências musicais de títulos exaltação ao bloco Ilê Aiyê:

– Que bloco é esse?
– Canto sideral
– Ilê de luz
– Entre laços de vida
– Negra sinfonia
– Charme da liberdade
– O Ilê é ímpar
– Negra tentação
– O mais belo dos belos
– Passagem do Ilê
– Negros de luz

CARNAVALESCO:
André Tabuquine

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