Portela
“Cantar será buscar o caminho
que vai dar no Sol – Uma homenagem a

Milton Nascimento”
Carnaval 2025

“Só quem toma um sonho
Como sua forma de viver
Pode desvendar o segredo
De ser feliz”

Seremos felizes, comunidade. Tirei meu sapato bicolor do armário, calça vincada, camisa alinhada, anéis e cordão, aquele brinco de águia, tudo está no lugar. Peguei o paletó, branco feito a calça, feito nuvem. Chapéu na cabeça. Não precisam dizer nada, já sabem que voltei.

Eu sou a Portela, nós somos a Portela. Já podaram nossos momentos, desviaram nosso destino, nosso sorriso de menino. Mas renova-se a esperança, nova aurora a cada dia. Vamos falar de uma coisa: Adivinha onde ela anda? Deve estar dentro do peito de cada brasileiro.

Para o cortejo de 2025, voltamos para lhes trazer uma ideia: A de atravessar esse país em uma procissão, uma caravana, uma cruzada, como quiserem: Apontados pela Águia, de pé no chão, sandália, o que for, de mãos dadas ou braços abertos cantando e buscando o caminho que vai rumo ao altar do sol, onde nos encanta a voz de Deus.

Com a roupa encharcada e a alma repleta de chão, todo povo irá onde seu artista está, nos rastros deste canto tão sublime.

No caminho contrário dos vibratos do seu som, caminhando contra o vento, seguindo sua origem, os ecos das montanhas das Geraes, a grande riqueza da Minas, respeitando seus 81 anos de estrada, vamos ao encontro de todas as vozes de Milton Nascimento, este que fala a língua do povo como ninguém fala mais.

A procissão do samba, a festa do divino carnaval, seguirá disposta a se juntar a tudo que o que vier por este caminho, todos que estiverem nesta busca. E cantando nada será longe, tudo será tão bom. A cada novo grupo, a cada nova ala, cada segmento que entrar nesta “festa de reto”, estará carregando em sua voz embargada e repleta de devoção uma música, uma ideia letrada ou um sentimento musicado que embalou a construção do ser brasileiro.

Seremos viajantes, menestréis, vendedores de sonho que espalham esperança transformando sal em mel, juntando todas as andanças, reencontrando o Brasil que ainda segue esse meu poeta que ninguém pode calar.

Não há o que me justificar, nunca será tão cedo, ou tão tarde, para lhe homenagear. Sempre é tempo. Bituca, nossa travessia até você começa agora.

1.
Erguem-se os estandartes e a bandeira / Mil tambores da Portela, despertaram àquele dia / Para a travessia, brilho cego de fé e paixão / Nada será longe, tudo será tão bom.

Levam no corpo o mel do suor / Levam nos olhos a dança da vida / Carregam nas vozes, gratidão e amor / Carregam um sonho em cada andor.

Deram o primeiro passo / Abriram o peito à força numa procura / Pediram a seus padroeiros: Proteção / Á Águia Altaneira: Direção / Dos baluartes receberam a benção.

E dos seus ancestrais a bravura / Bordaram com a linha a rota de estrelas / vestida das letras e sonhos tão lindos / Estampado na alma um verso ou canção / Um samba no peito, um girassol na mão / Cantaram, cantaram e cantaram.

2.
Dobrando as esquinas, teve gente chegando / Baquetas rufavam e o povo cantando.

Pó, poeira, ventania / Chão de histórias, melodias, procissão. / Marias se enfeitam com as flores do dia / O trem corre à margem da peregrinação / Mais gente chegando, sanfona, cantoria / Ecoam dos trilhos, as trilhas da vida.

Vozes embargadas murmuravam no caminho / Coisas que ficaram muito tempo por dizer / Essa estranha mania de ter fé na vida / Reuniu um cortejo que sonhava em ver.

O SOL

Um rio de asfalto, barro e gente / Visto de cima eram muitos afluentes / Não paravam de chegar, de todo lugar / O povo abraçado, uma grande corrente / Inventaram um cais, se fizeram de mar / Enfeitaram jangadas para continuar.

Faziam festa e se faziam carnaval / Sentiram os sons, foram contra o vento / Tocavam acordes, lembravam momentos / Seguiram a voz de Deus, Milton Nascimento.

3.
A tarde sorria para o cortejo / A ao arrebol, todos reconheciam, a voz solar que ouviam: / “Pra quem quer me seguir, eu quero mais / tenho o caminho do que sempre quis”.

E continuaram…

Com a roupa encharcada e a alma repleta de chão / Traziam as noites de chuva e as estrelas do sertão / Inventavam na sombra a nova cadência / Rompiam fronteiras, caminhos abertos / A marcha do povo, da gente que é crente / Que é solo e semente, que é canto liberto.

As vozes da terra, e o orgulho do lugar / Correnteza de gente que não parava de andar / Remavam por cima os ava-canoeiros / O canto yanomami se juntava ao cortejo / Agora, unidos, venciam o medo.

Acordes que afagam a terra, sólida ou não / Terra como ideia, território, nação / Terra que tem seus desejos guardados: / O cio, o parto, enfim, os filhos do chão.

Terra-cultura-identidade / Essa que os tambores nunca esquecerão / Tinha sangue no couro dos que se uniam a procissão / Tocavam pros rituais de txai, pros rituais dos irmãos / Tocavam pros quilombos, onde a terra é a única opção.

E todos cantavam, cada um a sua cantiga / Ouvindo de longe o sol trovador / Adubavam o solo com raça e vida / Das suas raízes: um novo andor.

4.
Conforme a noite caía, as velas se acendiam / E a cantoria esfuziante virou melodia constante / O tom de calmaria é também vigilante.

Sorrisos se desenhavam no amargo do cansaço / Desafiando a escuridão a cada passo / Sussurravam harmonias doces de ouvir / Gritavam os nomes dos que não estavam ali.

O breu esvaziava a esperança no amanhecer / Escondia essa gente e tudo o que podiam ser / Mas, resistia na boca da noite um gosto de Sol / Sonhavam com a alvorada, com a chegada, com o arrebol.

E quem voou no pensamento, ficou / Choveu e ventou, nenhum estandarte baixou / Era a crença que o sol voltaria / Viria um tempo brilhante e mais uma vez cantaria: / Nada será como antes.

Foi então que aos poucos ele surgiu / E do andor dos novos tempos enfim emergiu / O sorriso de menino, escondido outrora / Na fé de um novo dia, o despertar de nova aurora / O calor do astro-rei foi banhando o rosto / De cada viajante, de sonho teimoso / Que busca justiça e que faz o país / O suor já pingava, semblante feliz.

Caminharam e viveram com a alma de emoções / Agora podiam entoar as letras daquelas canções / Aquecidos pelo sol que vem depois do temporal / Cantaram semeando um sonho que já era real.

5.
Era um, era dois, era cem / Mil tambores e as vozes do além / era aquele mundaréu de gente chegando / para ver o Sol em seu trono posando.

Já ecoava nos vales das Geraes / a felicidade na chegança, não paravam mais / Era cantoria para todo lado / Os Tambores de Minas soaram.

Recebidos com cortejo de Reisado / Congadas, maracatus e festa do divino / Tambores vibravam para o Sol coroado / Toques de candombe, dos negros escravos.

Oh Deus, Salve o Oratório / Oh Deus, Salve o Oratório / Onde o Sol Fez a Morada, oiá / Ecoava em Três Pontas, revelou-se o lugar / Era ponto final, estrada natural / A romaria encontrava seu Deus magistral.

O Sol

Que modulava uma linda melodia / Como se em seus ouvidos soprasse a voz de Oxalufã / E envolvido em seu branco manto / Os abraça com axé e encanto / Com a doçura serena de toda manhã.

O santo preto do altar barroco / Recebeu a travessia, abençoou o seu povo / Tocaram os sinos para o senhor das estradas / o anjo negro da santa semana em sua morada.

A Portela, com os que te amam, abraçou e sorriu / No altar, eis o Sol, e então a vitória / Agradeceram ao tempo, receberam a glória / Agradeceram a Milton Nascimento, por suas próprias histórias.

Fim.

A estrada fez o sonho acontecer / É o meu modo de lhes dizer / Até a quarta-feira quando o sol retornar / Com cantos de alegria no ar / Abram alas…

Autores do Enredo:
André Rodrigues e Antônio Gonzaga
Desenvolvimento e Sinopse:
André Rodrigues e Antônio Gonzaga
Pesquisa e texto de apoio:
Beatriz Chaves e Marcelo David

Consultoria:
Ana Maria Gonçalves
Claudio Henrique Vaz

Danilo Nuha, Jader Moraes
Juliana Joannou,
Lola Ferreira
Lorraine Mendes,
Luna Sassara
Nathalia Bezerra,
Pedro Alvarenga
Rafael Galante e Renato Lemos

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